Em outubro de 2019 o diretor executivo da SPVS, Clóvis Borges, foi convidado para uma palestra na Universidade Federal do Vale de São Francisco (UNIVASF) em Petrolina. O tema de sua fala seria O conceito de Produção de Natureza aplicado em estratégias de conservação da biodiversidade no Brasil – o caso Grande Reserva Mata Atlântica. O objetivo era apresentar aos alunos como a metodologia poderia ser replicada em outros biomas, gerando oportunidades e benefícios dentro de um ciclo virtuoso.
Alguns meses mais tarde, ao acompanhar o monitoramento das redes sociais da SPVS, recebemos uma grata surpresa. Os alunos que haviam assistido a palestra, estavam se organizando para pesquisar e aplicar a metodologia em sua região. Sob o Núcleo de Estudo em Conservação via Pesquisa em Produção de Natureza – NCPN, o grupo multidisciplinar de pesquisadores tem o objetivo de fortalecer políticas públicas de conservação do patrimônio natural, o ecoturismo e o desenvolvimento regional em Pernambuco e Bahia.
Hoje a SPVS tem a alegria de contar um pouco mais desta história por meio da entrevista com Luciano Modesto, formado em biologia e mestrando na área de Ciências Biológicas na UNIVASF. O pesquisador, que assistiu à palestra, é um dos responsáveis pela liderança deste grupo.
Luciano, atualmente o grupo é formado por pesquisadores de que áreas? Qual a importância vocês percebem em uma composição tão multidisciplinar?
Bom dia Marina e todas e todos que estão acompanhando a entrevista. É uma satisfação enorme conversar com uma organização tão respeitada como a SPVS. Então, atualmente o nosso Núcleo é composto por profissionais da Biologia, Administração, Engenheira de Produção, Engenharia Sanitarista e Ambiental e uma Fisioterapeuta que seria o maior exemplo de que a Produção de Natureza é um conceito totalmente interdisciplinar. Ela está nos ajudando na construção de uma cartilha sobre plantas medicinais do distrito de Itaitu, que fica no município de Jacobina-BA. Além disso, há estudantes de diversas outras áreas, sendo a maioria deles da Biologia, mas temos também estudantes de Agroecologia e Engenharia Agronômica por exemplo. Outra linha que estamos adotando são os de consultores para projetos, temos profissionais de Tecnologia de Informação e Desenvolvimento, Publicidade e Propaganda, um Engenheiro Civil de Bioconstrução e um mestrando em Gestão Pública que trabalha com economia solidária, como parceiros do nosso núcleo.
Percebemos que uma equipe multidisciplinar nos ajuda a compreender determinados problemas de diferentes ângulos. Eu costumo brincar com o pessoal que se a gente não conseguir se fazer entender aqui dentro, sendo profissionais de diferentes áreas, como podemos passar esse tipo de conteúdo para os moradores de comunidades rurais?! Houve uma tendência dentro da ciência à especificidade trazendo um conhecimento cada vez mais técnico que acaba se distanciando da “linguagem” da população, esse é um problema sério e antigo que está mudando aos poucos. Nós queremos ajudar nessa mudança, em um processo de construção coletiva, baseado nos ensinamentos da Produção de Natureza, juntos no Barco da Conservação fazendo a roda girar.
Como vocês estão organizando os primeiros debates em grupo?
Então, o surgimento do grupo tem pouco mais de um mês. Dia 11 de Abril foi quando a gente conseguiu reunir as primeiras 15 pessoas para compor o NCPN, hoje estamos em 24 participantes e nossos debates estão sendo organizados primeiramente internamente. A gente percebeu que estávamos pulando etapas e decidimos parar um pouco para estudar e fazer uma organização interna, a organização que por sinal é o último e um dos mais importantes capítulos do livro Produção de Natureza.
Dividimos o Núcleo em 4 subnúcleos, são eles: Gestão Interna; Socioeconômico Ambiental; Promoção e Científico para cumprimento das tarefas e atividades. Criamos um Plano de Capacitação interna baseado no que vimos do Instituto Chico Mendes, dividido em: Formação Inicial; Formação Básica; Formação Específica e Formação Gerencial. O livro Produção de Natureza foi dividido e estamos marcando uma agenda de estudos e dos tópicos ali abordados. Estamos planejando palestras sobre Economia Solidária, Unidades de Conservação, a Lei do SNUC 2000 entre outras questões. Para as nossas reuniões, estamos usando aplicativos de voz e vídeo somado ao drive do Google para construção dos projetos em conjunto. Enfim, estamos aproveitando o tempo que temos e está sendo uma experiência bem diferente que pode ser aplicada para o futuro.
< Nosso plano atual de capacitação interna – O inicial já está pronto e o básico em processo de construção>
Quais as expectativas do grupo para os próximos meses?
Está sendo um momento de aprendizado e construção coletiva, estamos passando por um processo de profissionalização das nossas atividades. Acreditamos que o CNPJ pode ajudar no futuro para fazer parcerias, então, nas últimas semanas estávamos “organizando a casa” e pensamos em transformar o núcleo em uma organização sem fins lucrativos, provavelmente uma associação. Já temos uma meta e um norte bem definido, o que é bom, e como uma organização definimos nossa missão, visão e valores. Nos próximos meses pretendemos aprofundar esse conhecimento e desenvolvimento do grupo para pós pandemia estarmos bem organizados e engajados nos nossos projetos. O último capítulo do livro que trata de aspectos organizacionais tem ajudado bastante na compreensão da importância de se organizar e passar a Produção de Natureza como algo apaixonante mas com seriedade e profissionalismo.
Além do estudo e compreensão da metodologia, com análise do case Grande Reserva Mata Atlântica, quais outras ações são planejadas pelo Núcleo?
Temos projetos de avaliação de quatro áreas sob a perspectiva de Produção de Natureza, uma delas é o meu projeto de mestrado onde pretendo avaliar o distrito de Itaitu, já citado anteriormente. A região do Piemonte da Diamantina é muito rica em belezas naturais e tem um potencial gigantesco, mas precisamos “vender” essa ideia, fazer com que todos os envolvidos no processo “comprem”, e isso inclui os três setores. As pessoas precisam entender que na Conservação há uma oportunidade como diz brilhantemente o Ignácio, é uma oportunidade única de proteger nossa biodiversidade gerando desenvolvimento para comunidades rurais. Além disso temos um projeto que foi enviado por um dos nossos estudantes de biologia para a FACEPE, com avaliação da Unidade de Conservação Refúgio da Vida Silvestre Serras Caatingueiras, criada com participação efetiva do CemaFauna e do Nema, aqui no interior do Pernambuco e dois distritos de Sento Sé na Bahia, sendo eles Brejo da Brasida e São Pedro. O mais interessante é que cada uma dessas regiões tem características e potenciais distintos de produzir a natureza, acredito que vai ser bem interessante acompanhar isso nos próximos meses/anos.
Na obra Produção de Natureza, o biólogo Ignácio Jiménez (criador do conceito e autor do livro) reforça o quanto a consolidação de parcerias é importante para que resultados efetivos em conservação sejam possíveis. Entre os parceiros, está a academia. Quais contribuições vocês acreditam que possam se tornar possíveis com o desenvolvimento de pesquisas na área de produção de natureza em Pernambuco e Bahia?
A gente tem uma sensação que o Interior do Pernambuco e da Bahia estavam apenas esperando uma iniciativa semelhante surgir sabe?! Diversas pessoas já nos contataram e pretendemos ampliar nossas ações no futuro, mas não queremos dar um passo maior que as pernas. Esses quatro projetos vão servir como uma avaliação tanto da nossa região quanto da nossa organização, se tudo correr como planejamos, pretendemos fazer parcerias com fundações, empresas, associações, prefeituras, governo do estado, entre outros atores dessa transformação social. Estamos bem esperançosos e entusiasmados com a capacidade de mudança de pensamento social, eu acredito que a Produção de Natureza é muito mais que uma ideia de transformação das áreas protegidas, talvez seja um conceito de transformação social. Um dos nossos valores diz, ‘Proteger a Natureza e Proteger as pessoas’, somos um grupo de sonhadores que antes de tudo, acredita.
Mais detalhes desta história podem ser acompanhados pelo perfil no Instagram (@ncp.natureza). Para a SPVS e a Grande Reserva Mata Atlântica é uma alegria imensa compartilhar esta novidade. Desejamos que a iniciativa dos alunos gere resultados de sucesso beneficiando e criando oportunidades para a região. Contem conosco!