O município de Antonina, bem como Morretes e Guaraqueçaba, no litoral norte do estado do Paraná, estão na região central da Grande Reserva Mata Atlântica e concentram as maiores áreas ainda bem conservadas desse Bioma. Desde o início de sua gestão, há oito anos, o então prefeito de Antonina, José Paulo Azin, que entrega ao final do ano a posição à sua vice, Rosane Osaki, recentemente eleita, buscou aproximar os esforços de conservação da natureza realizados no município com a agenda social e econômica.
Quando exerceu posição como Secretário de Saúde, anos atrás, havia sempre recursos adicionais para garantir investimentos em sua pasta, que tinham como origem a geração do ICMS Ecológico (ICMS-E), oriundos das Unidades de Conservação, públicas e privadas, existentes no município. Estes "recursos extras" chamaram a atenção do prefeito, que procurou a SPVS para uma abertura de diálogo, visando incrementar a entrada de recursos ao município, que prometia gerar um ganho bastante relevante ao local.
Com uma Reserva Natural implementada em 1993, e outras duas a partir dos anos 2000, a SPVS (Sociedade de Pesquisa em Vida Selvagem e Educação Ambiental) mantém mais de 19 mil hectares de áreas naturais nos municípios de Antonina (Reserva Natural das Águas e Reserva Natural Guaricica) e em Guaraqueçaba (Reserva Natural Papagaio de Cara-Roxa). Boa parte dessas áreas já foram transformadas em Reservas Particulares do Patrimônio Natural (RPPNs), uma categoria de Unidade de Conservação, que garante a proteção perpétua das áreas. Esse é também um fator preponderante para a garantia de receitas decorrentes da Lei do ICMS-E, instaurada de forma pioneira no Paraná no início da década de 1990.
Dessa aproximação, um esforço articulado pela prefeitura de Antonina iniciou a formulação de uma Lei Municipal, que proporcionasse um devido reconhecimento aos proprietários de RPPNs. A iniciativa tinha dois objetivos claros: gerar um incremento na arrecadação pré-existente do ICMS-E e proporcionar um apoio financeiro para estimular o incremento da gestão das RPPNs já existentes no município, bem como estimular a criação de novas Unidades de Conservação.
Com a aprovação da Lei e sua Regulamentação, desde o ano de 2023 o município de Antonina colocou em prática o chamado Programa de Pagamento por Serviços Ambientais (PSAM), dando um exemplo para todo o país de compatibilização de iniciativas voltadas à conservação da natureza com o atendimento a outras prioridades de gestão voltadas ao atendimento direto da população local. Atualmente, já existem sinalizações de proprietários privados no sentido de criar suas RPPNs em Antonina, bem como as áreas da SPVS vêm realizando ações de refinamento de sua gestão, o que amplifica de forma relevante a arrecadação do ICMS-E nos anos seguintes.
Mas não é apenas a manutenção e o incremento da geração do ICMS-E que colabora com o desenvolvimento do município. Toda a água que abastece cerca de 20 mil habitantes da cidade de Antonina é originada na Reserva das Águas, da SPVS, em condições de abundância, mesmo em períodos de estiagem. Além disso, esses recursos hídricos exigem praticamente nenhum tratamento. As Unidades de Conservação representam um enorme atrativo para o incremento do Turismo de Natureza e uma ampla variedade de atividades econômicas compatíveis com a conservação do patrimônio natural, cultural e histórico de Antonina. Apenas em 2024, já houve um incremento de aporte do ICMS Ecológico para Antonina na ordem de 1,5 milhões de reais para o ano seguinte em função do PSAM.
Os números impressionam. Uma estimativa aproximada dá conta de que as Reservas Naturais da SPVS já geraram uma arrecadação adicional, apenas a Antonina, na ordem de quarenta e oito milhões de reais. Sendo que a recente implementação do PSAM já apresenta resultados no incremento da arrecadação para o município, devido às práticas adicionais implementadas nas Reservas Naturais a partir dos recursos que vêm sendo repassados. Um “ganha-ganha” tão valioso, que a implementação de legislações municipais, à espelho de Antonina, vêm sendo cogitadas nos Estados em que o ICMS-E já está implementado. No caso de Guaraqueçaba, a Reserva Natural do papagaio-de-cara-roxa já gerou, de 2008 a 2023, mais de dez milhões de reais em retornos financeiros ao município. Guaraqueçaba, no entanto, ainda não dispõe de Lei similar à já conquistada por Antonina.
Justamente no momento em que o Brasil experimenta crises ambientais sem precedentes, decorrentes das alterações climáticas somadas à crise de biodiversidade, são estratégias dessa natureza, como o exemplo de Antonina, com capacidade de gerar resultados em grande escala, que precisam ganhar holofotes e gerar esforços de replicação de forma o mais ágil quanto possível.
Ainda são raras as iniciativas envolvendo compromissos de corporações em relação à conservação de áreas naturais, como foi o caso da constituição das Reservas Naturais da SPVS. É absolutamente necessário que o reconhecimento da importância de incorporar a conservação à gestão ambiental corporativa represente uma prática a ser implementada em todas as áreas da economia, com um reconhecimento ainda em tempo de nossa dependência extrema e cada vez mais evidente da existência de áreas naturais bem conservadas em proporção suficiente para garantir qualidade de vida e resiliência aos negócios.
Antonina é hoje um município singular, em que um de seus negócios mais importantes é a "Fábrica de Natureza", nome do programa de repasse de parte do ICMS-E a RPPNs, recentemente implementado. A expressão foi inspirada no conceito de "produção de natureza" que representa a base conceitual da iniciativa Grande Reserva Mata Atlântica, que abrange 60 municípios, entre os estados de São Paulo, Paraná e Santa Catarina, com mais de 2,7 milhões de hectares.
Certamente ainda há muito a ser feito, e de forma mais acelerada do que normalmente acontece. Não deve haver mais espaço para distensões e retóricas, tão bem conhecidas, que distanciam o desenvolvimento social e econômico da conservação da natureza.
Antonina é um município em que a gestão pública vem se esforçando de forma muito qualificada a fazer a sua parte, em especial direcionando caminhos a serem seguidos pelos demais. É assim que surgem novas políticas públicas capazes de alterar cenários na prática, gerando resultados múltiplos e que coincidem com a busca de melhorias efetivas da qualidade de vida da população.
Clóvis Borges é diretor-executivo da SPVS (Sociedade de Pesquisa em Vida Selvagem e Educação Ambiental).
Edição por Claudia Guadagnin, assessora de imprensa da SPVS.